Quando o vício em Games se caracteriza como uma doença mental
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Quando o vício em Games se caracteriza como uma doença mental

Assim como a Nomofobia (uma condição ou transtorno psicológico que se manifesta pela dificuldade, por parte de um indivíduo de se desconectar de aparelhos tecnológicos ou dependência tecnológica) já havia sido classificada como uma doença mental, desde 01/01/2022, o vicio em games começa a figurar no CID 11 – Classificação Internacional de doenças, oficialmente como um transtorno de cunho mental e emocional. Denominado como Gaming Disorder ou "transtorno de games" é um tipo de transtorno de controle dos impulsos com um forte componente de ansiedade generalizada. (Gaming disorder, no original em inglês). Ou seja, um padrão de comportamento no qual a necessidade de jogar prevalece frente a outros interesses vitais na vida da pessoa acometida pelo transtorno.


Mas como saber quando um simples lazer se transforma em um problema que deve ser levado a sério? Vamos lá, a doença foi catalogada levando-se em consideração alguns critérios primordiais para que seja configurada como um distúrbio mental. Por exemplo: a intensidade, frequência e duração do tempo de utilização dos games é um fator determinante para fechar um diagnóstico. O indivíduo se sente incapaz de controlar ou de colocar um limite no tempo em que realiza a atividade. Além disso, o jogo passa a ser sua prioridade em detrimento dos interesses vitais, como: comer, dormir, descansar, higiene, socializar, trabalho, estudo, dentre outras rotinas cotidianas. Por fim, é muito comum perceber que, à medida que o vício se torna incontrolável, a pessoa começa a ter uma escalada de tempo crescente para os jogos. Ou seja, o hábito altera a rotina e afeta o estado neurológico da pessoa, provocando o domínio do pensamento e intensificando o vício e a dependência pelos games. Portanto, pessoas que conseguem focar em outras atividades, mesmo que gaste muito tempo jogando, não entram nesta categoria classificatória.


Porém, cabe ressaltar que, existem sim benefícios na prática dos jogos de eletrônicos, principalmente para as crianças, pois podem evidenciar melhoras na atenção, foco, coordenação motora, na agilidade, no raciocínio lógico, na capacidade de concentração e na tolerância às frustrações. Benefícios observados também em adultos. No entanto, o que transforma a prática em um vício com elevados prejuízos para a saúde, é exatamente, a intensidade e frequência com que se joga, além da evidência do abandono de atividades cotidianas em favor dos games.


Pensando nas causas deste problema, ainda não temos uma causa específica e determinada, podendo ser um somatório de fatores. Claro que, a questão se torna muito subjetiva, pois pode ser por fuga da realidade, carência afetiva, necessidade de se desafiar a todo instante, procrastinação, baixa autoestima, dificuldades de autocontrole, impulsividade, deficiência comunicativa, déficit do manejo emocional, timidez em excesso, depressão, ansiedade, prejuízos cognitivos, dificuldade no gerenciamento das emoções, entre outros. Mas, assim como todo tipo de vício (drogas, alcoolismo, tabagismos, sexo, compras...) existe o fator recompensa cerebral. Um mecanismo biológico que provoca motivações para permanecer no vício. Isso acontece porque ao jogar, o neurotransmissor dopamina é liberado, provocando prazer imediato, favorecendo a permanência na atividade.


Quando falamos especificamente das crianças, a omissão e falta de imposição de limites por parte dos responsáveis, ou mesmo, o incentivo destes para que a criança seja cada vez mais competitiva, podem ser causas determinantes do problema. O que muitos pais se esquecem é que, até mesmo o espírito competitivo deve ser dosado. Sem contar que a criança ao ficar muito tempo sob a tela de game, pode desenvolver sedentarismo, obesidade, problemas posturais, dores musculares, lesões nas mãos e braços por esforços repetitivos e até a má-nutrição. Lembrando que os adultos também não escapam de apresentar tais sintomas.


Apesar do ambiente virtual ser muito convidativo e atraente, uma vez que denota um espaço de liberdade, aguça a competitividade, possibilita o anonimato e mostra que pode se viver muitas coisas que não são permitidas no mundo real (exemplo: jogos violentos onde é preciso matar pessoas), o vício quando instaurado, provoca abstinência quando o indivíduo é impossibilitado de continuar no game. Provocando a manifestação de sintomas como a agressividade, a ansiedade ou irritabilidade.


E qual seria o melhor tratamento ou cuidado para que um simples lazer não se transforme em uma doença? Primeiramente, é preciso estar atento para observar mudanças comportamentais ou mesmo de humor ao se desligar do jogo. Refletir sobre as possíveis necessidades de isolamento e procrastinação de atividades em favor dos games. Busque ajuda de um profissional de saúde mental, que poderá através de técnicas e instrumentos específicos, realizar uma avaliação neuropsicológica e psicológica para a constatação do prejuízo social em razão do abuso ou dependência de games e, desta forma, fechar um diagnóstico e definir a melhor conduta. Normalmente, o mais comum é aliar um tratamento para transtornos de impulso. Além disso, em alguns casos a ajuda medicamentosa é recomendada, principalmente quando existe a presença de outras doenças do trato mental associadas ao transtorno de vício por games. Ou seja, tanto crianças, quanto adultos podem apresentar sinais de recuperação. Basta que o contato com os jogos seja monitorado. Isso não significa impedir a pessoa de jogar, mas determinar regras e definir horários, tomando o cuidado para que a exposição ao game não ultrapasse o total de três horas por dia. Media importante para controlar o nível do comprometimento psíquico do indivíduo, para que não ocorram recaídas.


Enfim, a cura desta condição de sofrimento é possível, desde que o tratamento adequado seja iniciado assim que os primeiros sinais do vício forem identificados. A eficácia será evidenciada de forma gradual, uma vez que a intensidade da prática de jogos for diminuindo, sem dor emocional identificada. Portanto, o autocuidado, o desenvolvimento pessoal, a clareza de informação sobre o transtorno e o autoconhecimento, podem ser armas muito eficazes no combate ao vício. Sem esquecer que a organização da vida cotidiana com rotinas determinadas por graus de responsabilidade, também tende a provocar benefícios em favor do emocional do ser humano. É importante se cuidar como um todo, se alimentando adequadamente com qualidade e em horários corretos; ter momentos de descanso e sono regulado, além de realizar atividades sociais que possibilitem a interação com outras pessoas, bem como praticar algum tipo de atividade física. Tomando todos estes cuidados para preservar sua saúde mental, corpo e mente encontrarão o equilíbrio desejado.

Dra. Andréa Ladislau

Psicanalista

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